Você viu a ocorrência da idosa de 72 anos saindo de um banco com R$ 354 mil na bolsa?


Por Saulo Nunes

Imagine a sua mãe ou avó, aos 72 anos de idade, indo a uma agência bancária, sozinha, sacar nada menos do que R$ 354 mil. Ela pega o dinheiro, coloca em uma bolsa e sai do banco de volta para casa numa boa.  Você, sendo filho ou neto dessa mulher, permitiria isso? Apoiaria essa atitude? Ou faria de tudo para evitar uma tragédia anunciada?

Agora esqueça o Brasil. Se essa situação acima fosse em um país como Portugal, por exemplo, que é tido como um dos mais seguros da Europa (e, consequentemente, do mundo), você deixaria sua mãe/avó de 72 anos ir buscar esse volume de dinheiro sozinha no banco?  Sim ou não?

Então vamos lá. Ontem (segunda-feira, 20 de junho de 2022), minerando informações de meu interesse na Internet, vi que uma idosa de 72 anos de idade foi roubada na saída de uma agência bancária na cidade de Espinho, localizada a 20 quilômetros de Porto, em Portugal.

A informação é do site JN Notícias, daquele país, e diz o seguinte: “uma mulher, de 72 anos, foi assaltada e ficou sem cerca de 65 mil euros, esta segunda-feira à tarde, em Espinho. O suspeito é um homem que montava uma bicicleta e seguiu a idosa até à estação ferroviária de Espinho, depois de a mesma levantar o dinheiro ao balcão do BCP”.

Viram? Um único assaltante, desarmado (pelo menos o site não fala sobre armas), montado em uma bicicleta, segue os passos de uma idosa e com um simples “esticão de braço” consegue roubar nada menos do que 354 mil reais - ou 65 mil euros -, em uma cidade de aproximadamente 30 mil habitantes, num dos países tidos como dos mais seguros do mundo.

Ah, claro, você pode dizer que “isso é caso isolado; não se compara com o Brasil”. E eu poderia até concordar, não fosse minha mania de continuar pesquisando as coisas. Minha ânsia pela pauta bateu num troço chamado Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) edição 2020, que exibe as estatísticas criminais de Portugal, publicadas pelo próprio governo e disponíveis a qualquer um na Internet.

Dentre as modalidades criminosas que o documento expõe estão os chamados “roubo em via pública exceto por esticão” (4.698 registros em 2020) e “roubo por esticão” (2.206 registros em 2020). O seja, as duas modalidades - com e sem ‘esticão’ - totalizaram 6.904 crimes. “Esticão”, pelo que pesquisei, é quando o ladrão toma ‘de supetão’ o bem que está com a vítima: um relógio, um colar, um celular... Ou uma bolsa com mais de R$ 300 mil dentro.

Esses 6.904 roubos cometidos anualmente em Portugal significam uma média de 19 crimes nessa modalidade por dia. Em termos proporcionais - já que a Paraíba tem 40% da população de Portugal -, é como se o nosso estado registrasse 2.761 crimes desses por ano (ou 08 por dia).

Pergunte-se:

1 - A Paraíba registra aproximadamente 2.761 crimes semelhantes aos roubos de Portugal por ano?

2 - Se sim, seria exagero dizer que a ‘violência’ da Paraíba é estatisticamente semelhante à de Portugal?

3 - Tomando-se por base esses dados comparativos, o que vivenciamos na Paraíba (e em outros estados) é insegurança ou ‘sensação’ de insegurança?

4 - Se os dados da Paraíba forem semelhantes aos de Portugal, por que este país é tido como um dos mais seguros do planeta?

Outros delitos

A edição 2020 do  Relatório Anual de Segurança Interna detalha outros tipos de delitos em Portugal: roubo a residência (659); roubo em edifícios comerciais ou industriais (468); roubo em transporte público (346); rapto, sequestro e tomadas de reféns (254).

A capital Lisboa, com seus pouco mais de 500 mil habitantes (para efeito de comparação, Campina Grande/PB tem 400 mil), registrou 69.993 crimes em 2020, em todas as modalidades, conforme os dados do RASI. Para refletirmos: quais seriam as estatísticas criminais gerais na Rainha da Borborema?

HOMICÍDIOS

Quando o assunto é violência homicida, aí não tem jeito. A Paraíba - e os demais estados brasileiros - estão muito distantes de uma realidade portuguesa/europeia. Enquanto Portugal contabilizou 58 homicídios consumados em 2020 (dados do Observatório de Imprensa de Crimes de Homicídio em Portugal), a Paraíba contou 1.166 mortes no mesmo ano. Absurdamente incomparável.

Mas há quem diga que os crimes de roubo impactam mais na sociedade...

Voltando à pergunta: você deixaria sua mãe/avó andar sozinha com R$ 354 mil na bolsa no Brasil ou em Portugal?

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PERFIL

Saulo Nunes é formado em Comunicação Social pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Ingressou via concurso público no sistema penitenciário do estado em 2009, onde permaneceu como policial penal até o ano de 2015. A partir daí, também após aprovação em concurso, passou a trabalhar como Investigador da Polícia Civil. É autor de Monte Santo: A casa de detenção de Campina Grande

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