Campina Grande, 20 de dezembro de 2025
Há algo de poético na escolha de instalar um parque tecnológico em um prédio histórico. Na passada quinta-feira, 18 de dezembro, quando a Paraíba inaugurou o Parque Tecnológico Horizontes de Inovação no antigo Colégio Nossa Senhora das Neves, no centro histórico de João Pessoa, o estado não apenas criou mais um ambiente de inovação, construiu uma ponte entre memória e futuro, entre o conhecimento que se acumulou naqueles corredores por décadas e as tecnologias que irão moldar o amanhã.
Pioneirismo que se renova
A iniciativa chega em um momento emblemático. Segundo o estudo Evolução, impacto e Potencial dos Parques Tecnológicos do Brasil, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e Universidade Federal de Viçosa (UFV), o Brasil já conta com 113 parques tecnológicos distribuídos pelas cinco regiões, sendo 64 em operação plena, 42 em implementação e 7 em planejamento. É um salto impressionante desde 1990, quando apenas dois parques funcionavam no país: o BioRio, no Rio de Janeiro, e a própria Fundação Parque Tecnológico da Paraíba (PaqTcPB), criada em Campina Grande em 1985. A Paraíba, portanto, não é novata nessa história, foi pioneira, fazendo parte da primeira geração de parques brasileiros surgida após o programa de implantação lançado pelo CNPq em 1984.
Essa trajetória é muito relevante. Enquanto a maioria dos parques tecnológicos brasileiros iniciou atividades apenas a partir de 2005, durante a fase de expansão mais intensa entre 2008 e 2013, a Paraíba já acumulava décadas de aprendizado sobre como articular empresas de base tecnológica com universidades locais. Campina Grande tornou-se referência nacional nesse modelo, e agora João Pessoa tem a chance de criar um segundo núcleo, com uma proposta urbana e setorial diferenciada.
A revolução dos parques urbanos
O que torna o Parque Tecnológico Horizontes de Inovação (PTHI) especialmente interessante é seu caráter simbólico e estratégico. Ao ocupar o Centro Histórico de João Pessoa, o parque sinaliza uma mudança de paradigma: inovação não precisa estar confinada a campus universitários ou áreas periféricas. Tecnologia e história podem coexistir, e até se fortalecer mutuamente.
A requalificação urbana por meio de parques tecnológicos é uma tendência recente no Brasil, transformando espaços centrais em vetores de economia do conhecimento e revitalização territorial. É um movimento que combina preservação patrimonial com economia criativa, atração de talentos com desenvolvimento local. Para empreendedores e startups, significa acesso a infraestrutura de qualidade em áreas centrais, com mobilidade, serviços e uma proposta de valor que vai além do escritório: estar em um ambiente que respira cultura, história e inovação.
Parques tecnológicos não são apenas prédios bonitos com internet rápida e equipamentos maneiros. Eles funcionam como nós estruturantes de ecossistemas, plataformas figitais e organizacionais onde universidades, empresas, governo e sociedade se encontram para transformar conhecimento e projetos em produtos, serviços e negócios. Os números nacionais comprovam essa capacidade transformadora.
Dados recentes do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação revelam que os parques tecnológicos brasileiros abrigam cerca de 2.700 empresas, com crescimento expressivo de faturamento, quadro de funcionários e registros de patentes entre 2017 e 2023. Estudos ligados à Anprotec indicam que empresas instaladas nesses ambientes geraram mais de 75 mil empregos e faturamento próximo a R$ 15 bilhões, a partir de investimentos públicos estimados em R$ 7 bilhões ao longo de três décadas. O retorno, portanto, é mais do que proporcional.
Análises econométricas apontam a existência de uma correlação positiva entre a presença de parques tecnológicos e o crescimento do PIB local, com potencial de até 1 milhão de empregos no Brasil à medida que o número de empresas e o impacto econômico amadurecem. Mas há uma ressalva importante: esses efeitos aparecem no médio e longo prazo, em ciclos de cinco a dez anos, dependendo de fatores como qualidade da governança, alinhamento com vocações regionais, consistência das políticas públicas e capacidade de atrair empresas com real potencial tecnológico e de impacto.
O que o parque oferece ao empreendedor
Para startups e empreendedores paraibanos, o Horizontes de Inovação representa uma oportunidade concreta de acelerar trajetórias. Os parques tecnológicos brasileiros bem-sucedidos comumente oferecem um portfólio robusto de serviços que vão muito além do espaço físico:
• Infraestrutura e ambiente: coworking, salas, laboratórios compartilhados, fablabs e espaços maker para desenvolvimento de protótipos e MVPs, tudo em um ambiente que facilita encontros casuais e colaborações improváveis, aquelas conversas de corredor que viram parcerias estratégicas.
• Programas estruturados: pré-incubação, incubação e aceleração, com trilhas de capacitação, mentorias especializadas e apoio à modelagem de negócios. Não é só "aluguel de mesa", mas acompanhamento técnico e estratégico que aumenta as chances de sobrevivência nos primeiros anos, os mais críticos.
• Acesso a redes: networking sistemático com grandes empresas, investidores, instituições de ciência e tecnologia e programas de fomento, editais, fundos, FAPs, Sebrae. É a diferença entre gritar no vazio e ter canal direto com quem pode contratar, investir ou parcerias.
• Conexão com universidades: proximidade com pesquisadores, laboratórios e grupos de pesquisa que podem se tornar cofundadores, consultores técnicos ou parceiros em projetos de P&D que alavancam competitividade.
• Apoio em propriedade intelectual: consultoria para registro de patentes, software e marcas, que são ativos críticos para startups tecnológicas que muitas vezes não têm recursos ou conhecimento para proteger suas inovações adequadamente.
A força das empresas âncora
Um elemento crucial e ainda pouco compreendido no Brasil é o papel das empresas âncora no ecossistema de um parque tecnológico. Essas grandes corporações funcionam como "peso pesado" que ancora demanda, reputação e investimentos, criando um ambiente mais estável e atrativo para startups, universidades e fundos.
Empresas âncora atuam como grandes compradoras de P&D, abrindo oportunidades de pilotos, provas de conceito e fornecimento para startups instaladas no parque. No Ágora Tech Park, em Joinville, empresas como ArcelorMittal, Krona e Schulz conectam-se a startups por meio de desafios de inovação, um caso emblemático é o de uma grande varejista que buscava solução para logística de última milha e acabou pivotando a parceria para logística reversa, validando a solução dentro do próprio parque.
A presença dessas marcas consolidadas aumenta a atratividade do ecossistema, servindo como "selo de qualidade": se grandes players mantêm operações ali, vale a pena instalar-se ou investir naquele habitat. Além disso, utilizam o parque como hub para programas de inovação aberta, hackathons e labs corporativos, aproximando a cultura corporativa das lógicas ágeis das startups.
E aqui está uma vantagem competitiva importante: o Horizontes de Inovação já abre suas portas contando com empresas âncora estruturadas, o que o coloca em uma posição privilegiada desde o início. Enquanto muitos parques levam anos construindo esse portfólio, PTHI sai na frente com parceiros consolidados em setores estratégicos. Essas empresas não apenas geram fluxo de receita e oportunidades diretas para as startups residentes, mas co-financiam projetos, participam da governança do parque e ajudam a estruturar cadeias produtivas locais.
Desafios à frente
A literatura sobre parques tecnológicos é clara: infraestrutura não basta. Parques que se tornam "elefantes brancos" geralmente falham em três pontos: governança fraca, desconexão com vocações e necessidades regionais, e falta de políticas públicas consistentes de longo prazo.
Para o Horizontes de Inovação, os próximos anos serão decisivos. É preciso construir um modelo de governança profissional, com participação equilibrada de governo, universidades, empresas e representantes da sociedade. É fundamental atrair e reter empresas residentes e associadas, oferecendo não apenas espaço, mas serviços de alto valor agregado. É indispensável estabelecer parcerias sólidas com investidores, fundos de venture capital e programas de investimento-anjo que irrigam financeiramente as startups em crescimento. E é estratégico manter alinhamento com as políticas estaduais e federais de CT&I, capturando recursos de editais, programas do MCTI, Finep, Sebrae, bancos de desenvolvimento, entre outros.
O antigo Colégio Nossa Senhora das Neves educou gerações de paraibanos em suas salas de aula. Agora, como Parque Tecnológico Horizontes de Inovação, ele se prepara para formar uma nova geração, não apenas de estudantes, mas de empreendedores, pesquisadores, inovadores e empresas que podem colocar a Paraíba na vanguarda da economia do conhecimento.
Os números nacionais mostram que o momento é favorável: em 2025, o MCTI destinou R$ 100 milhões para 17 propostas de parques em 9 estados, sinalizando compromisso federal com o fortalecimento dessa infraestrutura. A Paraíba tem história, tem talentos, tem universidades de qualidade e agora tem dois parques tecnológicos para orquestrar esse ecossistema.
Para os empreendedores e inovadores paraibanos, o convite é simples: o ambiente não somente está sendo construído, está ativo e funcionando. A infraestrutura, as conexões, os programas e as oportunidades já existem. Parques tecnológicos não inovam sozinhos. São as pessoas ousadas, persistentes e colaborativas que transformam tijolos e computadores em ecossistemas vibrantes. É hora de ocupar esses espaços, vivenciar e aproveitar essas estruturas, propor melhorias e construir, dia após dia, a Paraíba inovadora na qual queremos viver.
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Carlos Alejandro Rueda Angarita
Consultor Empresarial, Mentor Internacional de Negócios Inovadores e de Impacto Social, Doutor, Cum Laude, em Economia da Empresa, Mestre em Desenvolvimento de Sistemas para o E-commerce, Mestre em Economia da Empresa pela Universidad de Salamanca (Espanha), Administrador de Instituições de Serviço pela Universidad de La Sabana (Colômbia), +10 anos de experiencia em cargos de liderança, CEO do Núcleo Gestor do Ecossistema de Inovação de Campina Grande (E.INOVCG), Especialista em Empreendedorismo no Parque Tecnológico Horizontes da Inovação (PTHI), Embaixador da Economia Criativa da RBCC - Rede Brasileira de Cidades Criativas (UNESCO), Colunista do Portal Digital Hora Agora, Co-líder do NASA Space Apps International Challenge e do Tech Brazil Advocates Campina Grande.
