SUS/BRASIL: O abismo dos gastos entre pacientes feridos com armas de fogo e os internados após ‘acidentes de trânsito’


Por Saulo Nunes

Deslizando o dedo na tela do meu aparelho celular, à procura de assuntos de meu interesse, me deparei com o seguinte título de matéria: “Lesões provocadas por armas de fogo custaram R$ 37,8 milhões em 2020, revela pesquisa do Instituto Sou da Paz”. E eu cliquei no link, claro.

O texto acrescenta que, de 2009 a 2017, o Brasil gastou uma média de R$ 50 milhões por ano, com internações de pessoas feridas por armas de fogo. Um volume de recursos bem elevado, concorda?

Mas curioso que sou, não me dei por satisfeito e segui navegando na imensidão da internet. Daí, encontrei uma nota do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), com a seguinte informação: “Brasil gasta R$ 132 bilhões por ano com acidentes de transporte”. É isso mesmo que você leu: R$ 132 BILHÕES/ano. 

Em 11 anos - 2007 a 2018 -, essa guerra sobre rodas nas ruas e estradas do país torrou nada menos do que R$ 1,584 TRILHÃO, conforme detalha o Ipea. Um montante em dinheiro que a maioria das pessoas não vai saber sequer acertar com quantos zeros se escreve essa cifra. 

PONDERAÇÕES

É claro que é necessário fazer algumas ressalvas. O número de pessoas em veículos automotores é muito maior do que a quantidade de pessoas com armas, por exemplo. Segundo dados do IBGE, o Brasil teria algo em torno de 60 milhões de veículos circulando, entre carros, ônibus, caminhões, motocicletas, ciclomotores, etc. Isso, em parte, explica o tamanho da tragédia no asfalto. 

Quanto às armas, publicações informam que o Brasil tem em torno de 3,4 milhões de armas legalizadas. A quantidade de armas ilegais em circulação, por óbvio, não é conhecida, mas fala-se em 10 milhões no total (legais e ilegais). 

PONDEREMOS!

Só que o texto do Sou da Paz não dá detalhes dos confrontos armados que resultam em pessoas feridas e, consequentemente, nos R$ 50 milhões/ano de prejuízos. Nesta leva, podem constar os bandidos baleados por policiais, ou até mesmo os assaltantes que se deram mal ao tentar roubar uma vítima armada. 

Ou seja, em grande medida, os ‘prejuízos’ causados pelas armas de fogo ao Sistema Único de Saúde (SUS) são fruto de uma necessidade; uma legítima defesa própria ou de terceiros; um resultado inevitável. Uma fatia relativamente pequena desses R$ 50 milhões/ano é que advém de um mau uso da arma de fogo. 

O mesmo não se pode dizer sobre o eufemismo a que chamamos de ‘acidente de trânsito’. Inúmeras publicações afirmam que a maioria desses sinistros é causada por desatenção, imperícia, imprudência e desrespeito às normas vigentes. Em outras palavras, o mau uso da ‘ferramenta’. E poderia ser evitado. 

O ‘TRAUMA’ PEDE SOCORRO

Nesta terça-feira, 31 de maio, o diretor técnico do Hospital de Trauma de Campina Grande, Sebastião Viana, fez um verdadeiro apelo - e preocupante alerta - sobre as condições atuais daquela unidade. Ele disse que o hospital dispõe de 298 leitos, mas já contabiliza 310 pessoas internadas. 

Para piorar o cenário, o atual período de chuvas - que potencializa as ocorrências de ‘acidentes’ - e a iminência dos 30 dias de festejos juninos em Campina Grande são dois fatores de previsível complicação desse quadro.

1.300 TRAUMAS

Jornalista fazendo cálculo deve ser um desastre. Mas se eu acertei nas contas, os R$ 132 bilhões de prejuízos causados por ano no trânsito brasileiro dariam para construir nada menos do que 1.320 Hospitais de Traumas nos padrões do de Campina Grande. Por ano! 

Aquele gigante da Saúde teria custado cerca de R$ 100 milhões ao estado, conforme publicações/arquivos da imprensa, o dobro do dinheiro que se ‘gasta’ com os feridos por armas de fogo a cada ano no Brasil. 

Resumindo: o brasileiro causa muito mais prejuízos à nação com um volante em punho do que com uma arma na mão.

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PERFIL

Saulo Nunes é formado em Comunicação Social pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Ingressou via concurso público no sistema penitenciário do estado em 2009, onde permaneceu como policial penal até o ano de 2015. A partir daí, também após aprovação em concurso, passou a trabalhar como Investigador da Polícia Civil. É autor de Monte Santo: A casa de detenção de Campina Grande
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