Emboscada como a que matou o delegado Ruy Ferraz pode gerar um "Damião". Conhece Damião?


Por Saulo Nunes

O Brasil acompanha, estarrecido [quero acreditar], os desdobramentos da execução de Ruy Ferraz Fontes, ex-delegado-geral da Polícia Civil do estado de São Paulo, assassinado na noite dessa segunda-feira, 15/setembro, em Praia Grande, litoral paulista. Para quem eventualmente não saiba, o cargo de delegado-geral é o mais alto da instituição; a cadeira/caneta mais poderosa da Polícia Civil nos estados. Repugnante sob todos os aspectos, emboscadas como a aplicada para matar Fontes são capazes de gerar consequências preocupantes. Inclusive, a chamada ‘psicopatia policial’.

Nessas últimas 24 horas, centenas de textos jornalísticos relatam a história profissional de Ruy, mencionando-o como o primeiro delegado do Brasil a investigar e bater de frente com o PCC, facção que o estado [político] de São Paulo deixou nascer, crescer e se espalhar para outros países. Com passagens por diversas unidades especializadas da Polícia Civil paulista, Ferraz e seus policiais – pelo que se publica – incomodaram bastante as grandes lideranças criminosas da facção, fazendo o que deve ser feito para o bem do povo. 

As investigações sobre o caso estão apenas começando e pouco se sabe sobre o crime. A ‘linha’ mais citada (sem comprovação ainda) aponta para uma espécie de ‘vingança’ da facção contra o homem que dedicou sua vida por uma sociedade mais segura. Morto aos 63 anos, Ruy é mais um policial assassinado pelo simples fato de cumprir sua função. 

E se na Paraíba...?

Imaginemos – apenas para exercício de reflexão – que algo semelhante ocorresse na Paraíba. Sim, muitos policiais nossos já tombaram em confronto e é possível que alguns desses casos escondam circunstâncias semelhantes ao de Ruy Ferraz. Como, por aqui, os policiais vítimas não ocupavam posições de destaque na cadeia alimentar social, talvez por isso as entranhas dos episódios tenham morrido junto com o ‘policídio’.

Mas não fechemos os olhos (ao menos antes de morrermos). Assim como aconteceu com torcidas organizadas e modinhas do funk – dois meros exemplos de ‘costumes’ que migram do Sudeste para a Paraíba –, o câncer das facções criminosas também deu o primeiro sinal no eixo Rio-SP e contaminou o país. Uma hora, a ousadia marginal poderá testar alvos policiais de maior vulto (midiaticamente falando) aqui no Sublime Torrão, a pretexto de mostrar o ‘poder’ do crime. 

O MP e a PF

Não, não sou eu quem diz. Por perversa coincidência do acaso, em menos de 24 horas após o assassinato de Ruy Ferraz, a Paraíba ‘acordou’ com a notícia de que a justiça recebeu do Ministério Público a denúncia contida nas investigações da Operação Território Livre – aquela que aponta esquemas entre traficantes líderes de facções criminosas e figuras políticas bem conhecidas no estado. 

De forma bem resumida, os acordos seriam firmados na base do “consiga votos para mim, que eu lhe dou empregos na máquina pública”. Mais ou menos isso. Eu já disse em outro artigo aqui no Hora Agora que histórias como essa eu ouvia nos idos de 2009-2010, sentado em um banco de madeira, na antiga Casa de Detenção do Monte Santo, em Campina Grande, em meio a 400 detentos livres em banho de sol, comendo pão com carne e suco de laranja feitos pelos próprios encarcerados. Só que agora não sou eu quem diz. É o Ministério Público e a Polícia Federal.

Dois inimigos... 

Quando forças políticas trocam favores com facções criminosas, estas se fortalecem. Depois, crescem; se estruturam; pegam em armas; e num belo dia, resolvem ‘se vingar’ matando policiais. São, portanto, dois inimigos contra o policial.

... e um psicopata

Cosme e Damião são pai e filho. Ambos policiais. Cosme – tal qual Ruy Ferraz – foi fuzilado por uma facção criminosa somente por ser policial atuante contra o crime. Damião, além de chorar a morte do pai, soube que os assassinos eram ‘sócios’ de forças políticas.

Cuidem da saúde mental de Damião. Pode ser que ele não ‘diferencie’ seus inimigos... 

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Saulo Nunes é jornalista, policial civil e escritor

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